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O PERIGOSO CAMINHO DA SERVIDÃO QUE ESTAMOS TRILHANDO

O PERIGOSO CAMINHO DA SERVIDÃO QUE ESTAMOS TRILHANDO

 

  

Dando continuidade ao último estupefaciente artigo (leia, por favor, para saber do que se trata o absurdo ocorrido: aqui), não há como deixar de lado o pensamento do processo de denuncismo que se está tentando implantar em nosso país, técnicas diabólicas feitas por políticos inescrupulosos com a ajuda da mídia para propagar a mentira e o terror psicológico.

 

O denuncismo é um dos meios mais eficientes de mudar a mentalidade de uma nação para fortalecer a força tirânica de uma ditadura. Os exemplos históricos (comunismo, nazismo e fascismo) são tão devastadores que não se pode desprezá-los.

 

Fato é que o denuncismo não apenas cria uma segregação na sociedade (criando a figura do inimigo da sociedade e da ordem), como cria uma ruptura na mente da pessoa que faz a denúncia, onde sua estrutura moral prévia acaba sendo degradada (desconstituída), de modo que renunciam aos valores morais que tinham antes ao agir contra eles, de modo que faz a pessoa buscar justificativas para a prática do ato cruel e danoso que agora se torna "bom" conforme o pensamento do ditador, tornando-a, no fim, mais um instrumento nas mãos do ditador (até ser ela mesma vítima de uma denúncia, pois é assim que funciona o reino de terror das tiranias).

 

Dizer que isto está sendo implantado não só no Brasil como em boa parte do mundo dito civilizado parece uma longínqua distopia de quadrinhos, mas não é. Está acontecendo. Veja as revoltas do Povo em França, em Irlanda, em Inglaterra contra o passaporte de vacina nos últimos dias (que parece nada significar ao nosso bom e pacato povo brasileiro).

 

Novamente vamos ao Dr. Robert Jay Lifton (Thought Reform and the Psychology of Totalism: A Study of Brainwashing in China). Vejamos parte do relato que traz de um cidadão chinês que não apenas passou pelos terrores da tirânica revolução comunista, como sofreu abalos talvez irreparáveis pela técnica da denúncia e da autocrítica, mas a sorte de ter, ainda que breves, clarões de consciência perante aquilo que lhe impunham e não se submeter total e absolutamente àquela loucura (embora tenha se submetido a parte dos atos tirânicos).

 

"Mas o segundo requisito não era tão simples, pois era a denúncia de seu pai, tanto como indivíduo quanto representante da velha ordem. Esse foi o último ato simbólico na reforma do pensamento dos jovens chineses, e muitos o acharam extremamente doloroso.

Um grupo percebeu que Hu estava particularmente relutante em criticar seu pai e começou a cutucá-lo em todas as oportunidades:

"Ele disse que a parte mais importante da reforma de um intelectual era a denúncia de seu pai - já que o intelectual quase invariavelmente vem de uma família rica que deve ter sido anticomunista, e se ele não denuncia seu pai, não pode ser um cidadão fiel do novo regime. "

Hu tentou implorar, alegando que não reteve nenhuma impressão clara porque ele e seu pai haviam se separado durante grande parte de sua infância. O grupo insistiu, entretanto, que "o pai é um herói para todo menino" e exigiu que Hu se posicionasse a favor ou contra ele.

Duas cartas que Hu recebeu da casa de sua família mais ou menos nessa época deram ao problema uma nova dimensão trágica. A primeira carta, escrita por seu tio, trazia a notícia perturbadora de que seu pai havia "combatido" publicamente e depois preso durante a campanha de reforma agrária em Hupeh, e pedia a Hu que usasse sua influência junto aos comunistas para garantir a libertação de seu pai. Um ou dois dias depois, Hu recebeu uma segunda carta, de seu pai, dizendo que ele havia sido libertado da prisão, mas que todas as propriedades da família haviam sido tiradas dele e que a situação familiar ainda era muito perigosa. Hu teve dificuldade em descrever para mim seus sentimentos neste momento, que eram compostos de choque, culpa e raiva.

No início da reforma agrária, Hu havia escrito a seu pai pedindo-lhe que cedesse voluntariamente a maior parte de suas propriedades aos camponeses vizinhos e cooperasse totalmente com os comunistas como um "senhorio esclarecido". O pai havia seguido o conselho do filho; e agora Hu sentia que os dois haviam sido enganados. Ele se lembrou de seu último encontro com seu pai, quando se recusou a seguir seu conselho paterno. Ele havia decidido entrar na distante Universidade de Nanquim, ao contrário dos desejos do pai, de que ele escolhesse uma instituição mais perto de casa; agora ele continuava ouvindo as palavras de advertência ao despedir-se do pai:

Vocês, jovens, não pensam mais na geração mais velha. Seu afeto por nós deve ser muito superficial. Você não entende o que um velho sente por seu filho. Nosso afeto por você está além da sua compreensão.

Veremos mais tarde que essas palavras foram menos do que justas; mas isso não salvou Hu de seu sentimento de remorso e de se castigar por desobedecer a seu pai e por não permanecer perto dele o suficiente para ajudá-lo em tempos de crise. Ele começou a imaginar - a partir de descrições que ouvira de reuniões de "luta" pela reforma agrária no norte - a imagem de seu pai sendo insultado, cuspido, espancado e apedrejado nas mãos de um "tribunal do povo". Ele imaginou seu pai preso em correntes; ele se lembrou de uma prisão sórdida que visitou anos antes, e ainda mais vividamente a sua própria experiência de ter sido brevemente preso pelos nacionalistas por causa de suas atividades antigovernamentais como um estudante universitário:

"Revivi todos os meus sofrimentos com esta visão de meu pai tendo o mesmo destino." Logo a dor deu lugar ao ressentimento: "Eu superei minha tristeza com meu desejo de vingança."

Ele se identificou intimamente com seu pai e viu em ambos os maus-tratos evidências de hipocrisia e maldade comunistas básicas: Comecei a sentir que meu pai e eu, cada um de nós à sua maneira, éramos inimigos dos comunistas.

Meu pai era velho e inútil, por isso foi perseguido por eles. Eu era jovem e útil, então os comunistas ainda estavam tentando me ganhar... Fui considerado pelos outros alunos um homem capaz. Meu pai gozava de grande respeito entre os camponeses, e sempre foi generoso com eles nas horas de necessidade, nunca um senhorio ganancioso, cruel, sem coração, de que os comunistas sempre falavam... Meu pai e eu tentamos muito trabalhar com o novo regime; ainda assim, nós dois estávamos sendo vitimados. Percebi que os comunistas não tinham senso de imparcialidade ou justiça. Eles insistiam em espancar qualquer pessoa que tivesse prestígio entre aqueles ao seu redor fora dos círculos do Partido, e fariam o que achassem necessário para conseguir isso, não importa o quão "esclarecidas" essas pessoas pudessem ser em relação ao comunismo... Pensei no velho modelo que havia desenvolvido em minha mente no passado de um Estado ideal comunista que daria terras aos pobres e ofereceria uma nova solução para uma sociedade corrupta. Mas percebi que o comunismo não se encaixava nesse ideal e que o comunista é um homem muito cruel que usa os pobres e seu ressentimento contra os ricos com o objetivo de promover seu próprio poder.

Enquanto ele me dizia essas coisas (e especialmente quando ele se referia a seu pai), Hu perdeu a habitual compostura, às vezes voltando os olhos preocupados para o chão, outras vezes andando inquieto pela sala. Ele parecia mais ansioso do que em qualquer outro momento durante nossas entrevistas; e na sessão seguinte, disseram-me que ele permanecera agitado após nosso encontro e insistira em passar várias horas sozinho com o intérprete, discutindo essas mesmas experiências.

Hu nada disse sobre as duas cartas a ninguém ao seu redor na universidade revolucionária. Ele encontrou uma solução de compromisso para a exigência do grupo de que denunciasse seu pai usando uma forma tortuosa de raciocínio comunista: depois de mencionar a benevolência de seu pai para com os camponeses, ele condenou seus atos como "ainda mais reacionários do que o abuso implacável... pelos perversos proprietários "porque" essas boas ações ajudaram a tornar a posição da classe dominante ainda mais inexpugnável "(uma declaração que ecoa a observação do Padre Luca de que, "O que você faz que é bom - é mau - precisamente porque é bom!").

Ao apresentar sua própria história de vida, Hu teve o cuidado de minimizar suas atividades estudantis de esquerda e até mesmo relacioná-las criticamente ao "individualismo", que era um tema central do documento. Só mais tarde ele percebeu o quanto este resumo era uma expressão de submissão pessoal:

É um relatório muito contra a minha própria vontade. Se você colocar este resumo de pensamento final diante de mim agora, eu poderia escrever um novo resumo contraditório a ele em cada frase. Se não é o medo, o que mais poderia levar alguém a fazer algo tão completamente contra sua própria vontade? Se eu não tivesse tanto medo, teria me recusado a escrever algo assim.

(...)"

 

Assim, caro leitor, o resumo da opereta é: ainda que você seja gentil e alimente bem o lobo faminto, ele acabará por te morder no final, é questão de tempo. Talvez seja tarde para a dica, mas: não alimente a fera.

 

Recomendo a leitura do livro citado, bem como o de Joost Merloo, recomendo especialmente o relato no livro de Shin Dong-hyuk: Fuga do campo 14, para vermos o que acontece com a vida e a mente das pessoas nas ditaduras, o terror e o medo que se instalam, a perda da estrutura moral quando vamos nos entregando voluntariamente à servidão, ao desejo de poder (destruidor e sem limites) de políticos diabólicos como estamos vendo no Brasil e no mundo.

 

 

Fico por aqui.

 

 

 

*Elvis Rossi da Silva é advogado e escritor

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