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Resolução 18, da ANPD: Nomeação de Sócio como Encarregados de Dados *

 

Dia 16 de julho de 2024, a Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD) emitiu diretrizes (Resolução n. 18) regulamentando a atuação do encarregado pelo tratamento de dados pessoais. A norma já era esperada pelos que atuam na área.

É bom salientar, desde de agora, como já havíamos falado em outra oportunidade, que a ANPD reafirmou posição de que o encarregado ou o exercício da atividade de encarregado “não pressupõe a inscrição em qualquer entidade nem qualquer certificação ou formação profissional específica”. O que não quer dizer que ele não necessite saber o que esteja fazendo ou estar muito bem assessorado.

Mas a questão mais importante e mais esperada era a relacionada ao conflito de interesse, uma vez que nem sempre as empresas poderão contratar um serviço externo para exercer tal atividade.

Afinal o sócio pode ou não ser Encarregado?

A norma não proíbe (aqui a ANPD atuou sabiamente), permitindo que sócios de empresas assumam a função de encarregado de dados, num primeiro momento. É preciso estar atento, porém, aos critérios definidos na norma para evitar conflitos de interesse.

Esta nova norma, que visa fortalecer a proteção de dados pessoais, impõe que o encarregado de dados atue com ética, integridade e autonomia técnica, conforme estipulado no Artigo 18 da regulamentação.

Autonomia

O critério deixa mais fácil identificar se existe ou não conflito de interesse. A norma deixa o que deve ser entendido como conflito de interesse; para a ANPD (que avaliará cada caso em particular) significa “situação que possa comprometer, influenciar ou afetar, de maneira imprópria, a objetividade e o julgamento técnico no desempenho das atribuições do encarregado”.

Assim, para que um sócio possa ser nomeado encarregado de dados, ele deve demonstrar autonomia em suas decisões relacionadas à proteção de dados, garantindo que não haja influências que possam comprometer sua integridade na função. Lembrando que a LGPD busca a proteção, grosso modo, dos consumidores pessoas físicas. Esta autonomia é essencial para assegurar que as práticas de proteção de dados sejam conduzidas de maneira objetiva.

Declaração de Potenciais Conflitos

Outro requisito expresso e fundamental é a obrigação do encarregado de declarar qualquer potencial conflito de interesse, sob pena de responsabilidade pessoal. Sem entrar em detalhes sobre a abrangência desta norma infralegal sobre responsabilidade (se bem que a responsabilidade principal permanecer com o agente de tratamento), o Encarregado deve ser transparente quanto às suas outras funções na empresa, especialmente se for um sócio, informando ao agente de tratamento (pessoa jurídica, no caso) qualquer situação que possa configurar um conflito. Por exemplo, seria difícil manter a objetividade e imparcialidade ou comprová-la (ainda que de fato exista) num caso onde uma empresa explore dados pessoais para criar produtos, como uma farmácia que faça uso de dados sensíveis para atuar mais ou menos com determinados medicamentos ou farmacêuticas.

Este nível de transparência é crucial para manter tanto a confiança do público quanto a integridade no tratamento de dados pessoais realizado.

A norma, todavia, acaba criando uma responsabilização que poderá, por exemplo, encarecer a contratação de Encarregados, bem como ter reflexo em seguros D&O.

Substituição

A empresa deve estar pronta para substituir o sócio designado como encarregado de dados, como previsto no Artigo 21, parágrafo único, inciso III, se um potencial conflito de interesse for identificado.

A postura da empresa deve basear-se nas boas práticas de governança (como determina a LGPD), assegurando que a proteção de dados pessoais de pessoas física não seja comprometida. Acreditamos que é um interesse comum do empresariado nacional afastar-se tanto do risco de penalidades aplicadas pela ANPD, como em demandas de consumo.

Conclusão

Ante a realidade empresarial nacional, neste aspecto, as empresas beneficiaram-se da Resolução 18, podendo, com cautela e bom senso, manter sua organização interna e atribuição de Encarregado deferida, muitas vezes, a um dos sócios.

Pensamos, assim, que a possibilidade de nomear um sócio como encarregado de dados foi mantida pela nova norma da ANPD, deixando às empresas a possibilidade de movimentar-se dentro de sua própria estrutura de gestão, mas continua a exigir, agora com mais clareza, um compromisso ético, transparente e constante avaliação quanto à proteção de dados.

 *Elvis Rossi da Silva. Cristão, pai de família, advogado. Autor de artigos jurídicos, escritor e jornalista independente.

Livros do autor: Circo Do Mundo  , Fábulas para Hoje  , Pensamentos ao Filho  , Contos Para a Infância , Plúrimas  , Aos Amigos que Não Tenho

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