NÃO BASTA FUNDAMENTAR, É NECESSÁRIO TER SUSTENTÁCULO LEGITIMADOR
Hoje, mais do que nunca, se verifica no Brasil a premente necessidade de atuarem os poderes do Estado com a máxima eficiência, mas não só.
O agigantamento do Estado nas últimas décadas tornou a máquina pública uma espécie de máquina de movimento perpétuo (perpetuum mobile), algo autômato que se esqueceu do povo, seu real fundamento e objetivo, sem descartar a questão da ideologização esquerdista das instituições, se revelando como um verdadeiro Leviatã.
Nas atividades do Estado um primado deveria ser a regra na atuação dos agentes públicos. Sabe-se que existem as razões de sua atuação, ou seja: "por que assim fez?" ou "deixou de fazer por quê?". Isto é o motivo. Agora, o que se esqueceu é que há algo além que dá legitimidade a isso, e não é a mera lei. Algo que é sustentáculo da própria existência do Estado. Esse elemento faz parte de seu objetivo fundante e, obviamente, deve fazer parte da sua atuação, da fundamentação do seu agir. Isso é um preceito ou pressuposto inolvidável: a legitimação das suas fundamentações.
A legitimidade do fundamento (da razão) de agir do Estado (seja órgão, instituição ou qualquer agente público, ou político) não pode ser colocada de lado, não é secundária.
Quando se fala em fundamentação não se pode apenas usar o vetusto pensamento da dura lex sed lex (não só porque segundo disse Sto. Agostinho em Do Livre Arbítrio: não se vê que seja lei o que não for justo), mas deve-se atentar para o povo, a historicidade contemporânea, a ética e os primados da dignidade humana, da cidadania, a real democracia.
Hoje a questão é ainda mais evidente e urgente.
Ainda que se buscasse apenas um fator jurídico-normativo para fundamentar tal assertiva, bastaria o inciso IX, do artigo 93, da Constituição do Brasil. Nele está o princípio da motivação das decisões judiciais (já que ele não se desvincula do princípio democrático). Reza o dispositivo:
IX todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei limitar a presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, ou somente a estes, em casos nos quais a preservação do direito à intimidade do interessado no sigilo não prejudique o interesse público à informação;
Dá para notar o "interesse público" até nas limitações alí estabelecidas!
A atuação jurisdicional traz seríssimas consequências para a sociedade, pois é o poder que não apenas existe para pacificar os conflitos na sociedade, mas, porque suas decisões acabam por criar o que se chama de precedentes, e não sendo equilibradas, tais decisões criam desordem (rompem com a ordem precedente - criando uma nova ordem pessoal, talvez?) e a tirania Judicial se instala (veja o artigo sobre Alexis de Tocqueville).
Tanto é que a moralidade fora içada a princípio constitucional aplicável ao Estado (no fim seus agentes, que é realmente quem age) na totalidade, não somente à sua manifestação administrativa), porque se devem satisfações ao povo, fonte real de todo o poder do Estado.
Quem é, no fim, o destinatário da decisão judicial? Não apenas as partes e o próprio juiz, mas a sociedade como um todo. A fundamentação não se resume a uma técnica aplicada num processo judicial qualquer, ela transcende isso.
A fundamentação (as razões de ser assim ou assado) deve atar-se e atentar-se aos valores superiores e transcendentes à vontade das partes e do próprio magistrado, ir para além de retórica vazia e palavras ou conceitos sem correspondência à realidade, isto é o que a legitima.
Dizer alguém que nada se deve ao povo é um falso princípio de independência, é uma falácia, pois a independência que se existe é funcional e é assegurada por algumas garantias dadas aos magistrados para não serem coagidos por inescrupulosos, mas como poder do Estado estão vinculados, sim, ao povo, ao elemento que funda a Nação, e tais garantias não o coloca como ser supra-nacional, super populo.
Ao contrário, o sobreprincípio da democracia impõe ao judiciário o dever de respaldar-se naquilo que a sociedade considere como bem maior, como justo, nos anseios dela, na voz do povo (vox populi), da maioria. Daí também dizer que a vontade da maioria é uma tirania, é um contrassenso que só pode ser acolhido por quem tenha interesse pessoal nessa dissonância.
Quando se está diante de uma decisão que tem a finalidade de solucionar um conflito, se espera que a decisão esteja próxima ao ideal de justiça e equidade que permeiam a sociedade, de modo que fazer o contrário é distanciar-se dela, é o movimento oposto ao da justiça (e nem estamos cogitando de deformações causadas por interesses menos valorosos).
É necessário que se perscrute o que anima a vida da sociedade para sua real pacificação, não pela força (uma dialética e imposta sobre os jurisdicionados), mas como algo que se coadune com a realidade, só assim se pode realmente fazer justiça.
Assim, não basta fundamentar, necessário é que as fundamentações tenham esse sustentáculo legitimador que deve existir na manifestação de um Poder do Estado, em especial o Judiciário.
Não seria isso?
Elvis Rossi
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